sábado, 12 de novembro de 2005

Bolsa Família

JB Online:

Mensalão assistencialista?


André Costa

Deputado federal (PDT-RJ)

Não raras vezes, meios espúrios têm justificado fins medíocres no governo Lula. Bem antes de a nação ser apresentada ao ''valerioduto'' - a engenharia de sustentação da base governista fisiológica no Congresso Nacional - os cidadãos testemunharam o ''desfazimento'' ético do governo e do Partido dos Trabalhadores. Da revitalizada e turbinada política assistencialista do ''toma um dinheiro aí'' à famigerada liberação de emendas parlamentares às vésperas da eleição para a presidência da Câmara dos Deputados.

De fato, o programa assistencialista Bolsa Família está por merecer maior atenção das classes dirigentes no que concerne aos seus efeitos práticos para além do urgente e necessário combate à miséria extrema. Definido por Lula como o ''mais ambicioso programa de transferência de renda da história do Brasil'' e ''o maior programa social já visto na face da Terra'', o Bolsa Família não é apenas um oceânico erro conceitual, mas pode ainda servir de máscara para a perpetuação da grande tragédia da nossa vida republicana: a compra de votos.

Um equívoco conceitual, pois bilionários recursos desprendidos em esmolas e propagandas tendenciosas seriam de melhor alvitre se investidos em frentes de trabalho e incentivo à produção, com a conseqüente melhoria das condições gerais de renda e emprego dos brasileiros. Ao contrário, o governo do presidente-operário optou pela nada original política assistencialista, num país onde medidas compensatórias servem essencialmente à acomodação de nosso apartheid social, nunca à definitiva união dos brasis. E o próprio governo fez questão de desnudar a hipocrisia original do maior programa social terráqueo de todos os tempos, ao reconhecer, nas palavras do ministro da Segurança Alimentar e Combate à Fome, Patrus Ananias, que a lista de presença de alunos matriculados em escolas não seria o ''critério essencial'' para o pagamento do Bolsa Família. Eis que o governo então solapa a excelente inspiração do Bolsa Escola, que visava a universalização do ensino e a preparação do país para a competitividade globalizada.

O drama, no entanto, ainda é maior. Com o reconhecimento oficial do frágil mecanismo de contrapartidas deste guarda-chuvas de programa (Bolsa Escola, Bolsa Alimentação, Cartão Alimentação e Auxílio Gás), o Bolsa Família favorece a acomodação dos interesses de quem o executa à lógica de um ''mensalão'' assistencialista, aportando um cacife de ouro ao mercado eleitoreiro. Esta marca compensatória do programa é ainda ratificada por governos estaduais e municipais, que também utilizam-no como moeda eleitoral, num país já marcado pela oferta abundante de compra de votos. Assim, o Bolsa Família torna-se o produto oferecido pelo voto vendido, o que de fato já pôde ser observado nas eleições municipais de 2004. E não é difícil imaginar o uso oficioso que será dado ao programa em 2006, na próxima eleição presidencial. Até porque o próprio presidente-candidato já anunciou um espetacular incremento dos recursos para o programa no ano eleitoral, ao mesmo tempo em que verbaliza cortes nos investimentos em infraestrutura.

A estratégia de ''dar o peixe sem ensinar a pescar'', aplicada sem interrupções em toda nossa história, confronta-se com o ideal da emancipação das famílias mais pobres do país, e antes opera pelo congelamento de nosso repugnante status quo. Se neste imenso país-continente a iniqüidade existente nos leva a medidas emergenciais e pontuais de inclusão social e dignidade humana, espera-se de um governo de esquerda e progressista o fim do incentivo a práticas coronelistas, como o voto de cabresto, extraído pelo porrete ou aliciado pela gratidão. Espera-se igualmente que a miséria seja combatida pela abertura de postos de trabalho, pela universalização do ensino e elevação de sua qualidade, o que dignificará a todos os brasileiros e certamente unificará os diferentes níveis de cidadania. Espera-se, para logo, um autêntico governo de esquerda no Brasil.

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quarta-feira, 9 de novembro de 2005

Microfone para entrevista? Não!

Merval Pereira em OGLOBO:

Fatos e versões

O presidente Lula tem toda razão de não conceder entrevistas coletivas, especialmente as que, como a do “Roda Viva” da TV Cultura, permitem o contraditório. A última entrevista que concedera no Palácio do Planalto teve como regra a proibição de réplicas, o que o deixou muito à vontade, quase que falando sozinho. Na segunda-feira, o ambiente estava muito cerimonioso, os jornalistas ficaram afastados do presidente, com uma separação psicológica e até mesmo física, com um tapete que dividia seu ambiente do dos entrevistadores.

Mas quando esses replicavam suas respostas, ficava claro que elas não correspondiam inteiramente à realidade. Como na letra de Cazuza, suas idéias não correspondem aos fatos. Como quando tentou negar que dinheiro do caixa dois tenha sido usado em sua campanha presidencial, e foi confrontado por Heródoto Barbeiro com o fato de que seus próprios aliados, como o presidente do PL Valdemar Costa Neto, haviam confessado. Lula foi ao ponto de perguntar a Heródoto “por que você acredita nele e não em mim?”, numa demonstração clara de que não tinha mais argumentos. Ou quando chegou a fazer um apelo a Augusto Nunes para que parasse de citar frases suas para confrontá-las com suas atitudes.

O presidente só foi poupado deliberadamente em poucos momentos da entrevista: quando Rodolfo Konder deixava de lado a crise política para filosofar sobre os caminhos da História, ou quando Matinas Suzuki introduziu o futebol na discussão, dando chance ao corintiano Lula de respirar um pouco. Houve momentos em que respostas vagas ou imprecisas do presidente Lula passaram sem contestação, como quando negou que tivesse declarado que daria um cheque em branco ao seu então aliado Roberto Jefferson.

De fato, nunca se ouviu da boca do presidente tal frase, mas Jefferson fez a declaração depois de um encontro com o presidente e demais líderes da base aliada, e o Palácio do Planalto não o desautorizou. Quando, no início do programa, Lula admitiu que o presidente é sempre responsável pelo que acontece no governo, mesmo que não saiba de nada, para em seguida dizer que o que cabe ao presidente “é mandar apurar” as denúncias, não foi contestado. Ora, na política ou em uma empresa, ser responsável pelos atos praticados por seus subordinados implica assumir as conseqüências desses atos, e poder ser punido por eles.

O presidente Lula se coloca o tempo todo à parte dos acontecimentos, e chega a duvidar de fatos que já foram confessados por seus aliados. Assim, caixa dois em sua campanha cheira a “fantasia”; mensalão na Câmara é “folclore”. Traiu-se em determinado momento ao se referir ao ex-tesoureiro do PT como “nosso Delúbio”, a indicar o que todos já sabem: que Lula era o verdadeiro suporte de Delúbio dentro do PT. Mesmo assim, atribuiu a Delúbio todos os malfeitos petistas, assim como, parecendo estar defendendo José Dirceu, deu-lhe o tiro de misericórdia ao fazer uma análise política que culminou com a constatação — correta, aliás — de que a Câmara está “condenada” a cassá-lo.

Se Lula está convencido de que não há qualquer prova contra Dirceu, por que o tirou do Palácio do Planalto em cima das acusações de Roberto Jefferson? E se de fato acha que sua cassação será exclusivamente por questões políticas, por que não orienta sua base aliada a defendê-lo na Comissão de Ética, onde foi derrotado quase por unanimidade?

Se ontem Lula tivesse se declarado esperançoso na absolvição de Dirceu, teria pelo menos dificultado a posição de deputados de sua base. Mas, aceitando como certa sua cassação e, mais que isso, compreendendo que essa decisão é a única resposta que os deputados podem dar à sociedade, Lula deu o sinal verde para a cassação de Dirceu. Ou o “beijo da morte”, como definiram líderes oposicionistas.

Ontem, a senadora Heloísa Helena disse no plenário do Senado que o presidente Lula “tem mel na boca e bílis no coração”, e que é capaz de dar um abraço, ao mesmo tempo em que apunhala pelas costas. Dirceu, Delúbio e Heloísa Helena conhecem Lula há muito tempo, saberão interpretar suas palavras melhor do que ninguém. A entrevista do “Roda Viva” deu ainda um roteiro do que será a campanha de reeleição, embora Lula tenha insistido em que não se decidiu se concorrerá. E Gilberto Carvalho, seu chefe de gabinete, tem razão quando disse que a campanha da reeleição será “dolorosa”.

O presidente mostrou que não tem condições de enfrentar debates sobre questões delicadas como o contrato de seu filho com a Telemar ou a compra do AeroLula, dois casos que o tiraram do sério durante a entrevista. Se estiver bem colocado nas pesquisas, Lula poderá até evitar os debates. Mas não escapará dos programas de seus adversários, que colocarão no ar declarações e noticiário que desmentem suas versões.

Quando garantir que quer apurar tudo nas CPIs, bastará que mostrem as manobras dos petistas para tentar impedir a criação das CPIs — a dos Bingos fora engavetada e só saiu por decisão do Supremo — e depois, a tentativa dos petistas de desqualificar as testemunhas contrárias ao governo e as manobras para evitar convocações desagradáveis.

Na entrevista do “Roda Viva”, sempre que acuado pelos fatos, o presidente Lula alegava que as investigações ainda estão em curso, e o relatório final das CPIs ainda não saiu. E indo mais além na tentativa de ganhar tempo contra as denúncias, lembrava que o Ministério Público ainda tem que aceitar as denúncias, e o Supremo Tribunal Federal terá que julgá-las. Na campanha eleitoral, provavelmente algumas dessas etapas estarão concluídas, reduzindo a margem de manobra do presidente. Mas, por esse raciocínio, ele acabará chancelando a tese de que o Supremo Tribunal Federal absolveu o presidente cassado Fernando Collor.

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domingo, 6 de novembro de 2005

A Artur o que é de Artur

Merval Pereira em OGLOBO:

Afonso Arinos esclarece que a aspiração do Brasil de ocupar uma cadeira permanente no Conselho de Segurança da ONU vem desde a predecessora da ONU, a Liga das Nações, na qual o Brasil foi o primeiro país a ter uma representação permanente, de 1924 a 1926, chefiada por Afrânio de Melo Franco. E dela nos retiramos, no governo Artur Bernardes, justamente por nos haver sido negado o lugar permanente no Conselho, que reivindicávamos.

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POLÍTICA DE PRIVACIDADE

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