sábado, 2 de agosto de 2008

A gestão Gil

Não se pode dizer que a gestão do compositor e cantor Gilberto Gil no Ministério da Cultura, durante os mais de cinco anos - e três tentativas de saída - em que lá permaneceu, tenha sido muito boa, ou muito ruim, assim como justo não seria atribuir-lhe a pecha de medíocre, algo incompatível, aliás, com a personalidade de um dos mais criativos artistas da música popular brasileira (MPB). É preciso dar à questão o enfoque correto e condicionar a avaliação à expectativa que se poderia ter na atuação de um artista de grande popularidade na condução da política cultural do País. Não se esperava - a começar pelo presidente Lula - que Gilberto Gil viesse a produzir uma política cultural de grande relevância, modificadora ou transformadora - no melhor sentido - da visão que a sociedade brasileira tem da Cultura e das Artes. Mas se esperava que o governo "pegasse carona" no prestígio artístico e popular do compositor-cantor baiano, fazendo-o funcionar como uma espécie de garoto-propaganda artístico do País pelo mundo afora.

Foi para isso que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva o convidou para o Ministério, pouco depois de eleito pela primeira vez, pelo que somos levados a avaliar que a gestão Gil não se saiu mal. O ministro espalhou a descontração e a informalidade típicas dos brasileiros ao cantar, dançar e transformar cerimônias oficiais, em vários países, naqueles divertidos espetáculos improvisados que só o irreverente talento caboclo seria capaz de produzir. Neste aspecto, nem são cabíveis as críticas feitas ao ministro, quanto ao fato de ele preocupar-se mais com seus shows internacionais do que com os compromissos burocráticos de governo, pois Gilberto Gil, no governo, apenas se dedicou a fazer mais o que sabe fazer melhor - e foi assim que deu visibilidade à sua Pasta ministerial, como, certamente, se previa quando de sua nomeação.

Deixemos à liberdade poética do artista da MPB o cálculo sobre o porcentual de sua dedicação ao governo e à carreira artística - 80% a um, 20% à outra? Tanto faz, pois, Gilberto Gil estivesse no Brasil ou no exterior, fazendo seus shows, da gestão dos assuntos burocráticos - e não apenas deles - do Ministério da Cultura incumbiu-se quem nunca foi artista: o sociólogo Juca Ferreira.

Importa mais registrar o que houve de mais positivo e de mais negativo. O mais negativo, diga-se desde já, foi a desastrada proposta, em agosto de 2004, de criação da Agência Nacional do Cinema e do Audiovisual (Ancinav), visando a regular as atividades no cinema e na televisão. Não houve como deixar de ver, na iniciativa, uma tentativa de interferência na liberdade de criação dos profissionais dessas áreas - o que resultou no arquivamento que o presidente Lula fez da idéia. Também se critica a gestão Gil por não ter cumprido a promessa, que fizera, de reformulação da Lei Rouanet, de estimulo à produção cultural. Mas a verdade é que, como já foi dito, não se esperava do artista qualquer renovação estrutural da política cultural do País. Os produtores de espetáculos teatrais e de outras áreas reclamaram muito da excessiva morosidade da tramitação dos projetos incentivados pela Lei Rouanet no Ministério da Cultura e suas comissões.

Menos reclamação fizeram os produtores de cinema, visto que os incentivos audiovisuais funcionaram melhor - haja vista à boa produção da indústria cinematográfica brasileira nos últimos anos. Também positivos na gestão Gil foram os justamente chamados "Pontos de Cultura", dedicados às novas mídias e facilitadores de acesso à internet - que hoje chegam a 733 instalações, espalhadas por várias regiões do País.

Sob o ponto de vista estritamente político, não se pode dizer que tenha faltado habilidade a um quadro do Partido Verde que se tornou um dos quatro ministros, de todos os empossados no início do mandato do presidente Lula, que permaneceram até agora. Isso não significa, porém, que estará firme no cargo, em definitivo, o sucessor que o ministro demissionário se incumbiu de anunciar - o seu braço direito Juca Ferreira. Pode ser que o Partido dos Trabalhadores e seus aliados tenham planos diferentes para o Ministério da Cultura.

Estadão

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