sexta-feira, 9 de dezembro de 2005

Nada a comemorar

Merval Pereira em OGlobo:

Sem as bases

Na campanha eleitoral que o elegeu presidente em 2002, o então candidato Lula prometeu combater a corrupção e, naquele exagero que hoje faz com que já não se leve a sério muita coisa do que diz mas que, naquela altura, soava aos ouvidos dos brasileiros como sinal de mudanças, disse que sua simples presença no Palácio do Planalto faria os níveis de corrupção caírem imediatamente.

Três anos depois, cercado por uma série de denúncias de corrupção que ceifou quase uma centena de ministros e auxiliares dos mais diversos escalões, inclusive o seu “núcleo duro” decisório, a Transparência Internacional, seção Brasil, divulga um relatório no Dia Internacional de Combate à Corrupção com o sugestivo título “Nada a comemorar”.

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segunda-feira, 5 de dezembro de 2005

É no fundão?

JBrOnline:

Lula entre o feijão e o sonho

GAUDÊNCIO TORQUATO

Ao atingir o índice de 46,7% de rejeição, Luiz Inácio Lula da Silva entra no inferno da condenação social. Se os dados da pesquisa CNT/Sensus se mantiverem até meados de 2006, o presidente poderá juntar-se ao rol de candidatos que amargaram derrotas por ultrapassar a margem dos 40%. Mais importante que traçar projeções sobre o futuro, até porque vitórias eleitorais no Brasil contemporâneo só são decididas nas vésperas do pleito, é desvendar as razões por que se vem acentuando a queda na avaliação positiva do governo. Se a economia está indo tão bem, com as exportações ultrapassando US$ 100 bilhões, a inflação sob controle e perspectiva de elevação do superávit fiscal para 4,7% do PIB, por que esta grandeza não eleva o governo ao mais alto pedestal do reconhecimento social?

A resposta à questão se insere no cerne das preocupações dos atores políticos que lubrificam armas e estocam munições para a batalha de 2006. O primeiro argumento abriga estilhaços da crise, que tem como personagem central o PT. A cadeia de episódios derrubou a imagem do partido, de seus representantes e governantes. Nos primeiros instantes do sismo, Lula agiu como prestidigitador, driblando as situações negativas, desviando-se dos tiroteios sob o escudo do magistrado rigoroso e empenhado em apurar as denúncias. Com sucesso, descolou a imagem pessoal da identidade do governo. A intensa e contínua exposição da bateria de depoimentos nas CPIs e a massiva divulgação de documentos incriminadores aproximaram a figura do presidente da fogueira. A atuação da mídia foi fundamental para furar a redoma presidencial.

A Lula restou a alternativa de entrar na arena e bater forte. No segundo ciclo da crise, acusou elites de tramar golpes, cantou os mantras do êxito econômico, dividiu com os partidos as tramóias cometidas pelo PT e cometeu erros fantásticos, como as referências ao uso generalizado de caixa dois. Formadores de opinião passaram a rebater as luladas. No meio da confusão, o Ministério perdeu rumo. A saída de José Dirceu foi mea-culpa. Ao entrar no terceiro momento da hecatombe que se abateu sobre o governo e o PT, com seqüelas em outros partidos, inclusive o PSDB, o País vive a grande interrogação: em que vai dar tudo isso?

O segundo argumento para a queda da avaliação positiva de Lula é a postura olímpica. Narciso apaixonou-se pela própria imagem refletida nas águas da fonte, definhando até morrer. Lula é o nosso Narciso encantado. Nada parece afetá-lo. Sente-se imune às intempéries. O suor do rosto é o bálsamo de uma política de carícias ao ego. Julga-se onisciente e infalível. Não ouve nem vê sinais de alerta. Promete acabar com as filas do INSS, mas é desmentido ao vivo pelo próprio ministro da Previdência, que nega a possibilidade. O discurso para platéias pré-selecionadas já não provoca o eco dos primeiros tempos. Michelangelo, diante da beleza de sua obra-prima, a escultura de Moisés, exclamou: "Fala, fala". Lula, extasiado, grita aos brasileiros: "Ouçam, ouçam".

Acredita que ganhará as eleições se puxar o cordão da sociedade pelas pontas do fundão. Espera que os 11 milhões de famílias beneficiadas com a "mesadinha" dos pobres façam a diferença. Erra quem assim pensa. A distribuição de renda por contingentes depauperados não é suficiente para endeusar Lula no Olimpo. A recente pesquisa até mostra que ele ganha apoio entre os mais carentes. Ora, o meio da sociedade está muito contrariado. E este povo do centro faz ecoar indignação até as margens distantes. Se o cobertor do governo cobre os pés dos pobres, descobre a cabeça dos setores que mais fazem girar o motor da sociedade. Ademais, Lula e o PT serão marcados pela ênfase: a maior roubalheira da história política, escancarada ao público, ocorreu no atual governo. Repartir esse legado com outros continuará a ser a meta dos petistas.

No romance de Orígenes Lessa, O Feijão e o Sonho, Campos Lara, o poeta, embalava sonhos. Maria Rosa, a mulher, pisava no chão da realidade. Batalhava para sustentar a família. A fantasia na cabeça de Lara e a escassez no prato de Rosa formam a antítese que alicerça a vida dos brasileiros. A aspiração de grandeza e a dureza do cotidiano explicam a nossa trajetória. Talvez esteja nessa dualidade mais uma explicação para a crescente desesperança em Lula. O feijão não chega para todos. E o sonho da grande virada se desmancha no ar poluído da política. Lula cai nas pesquisas porque a tocha da esperança que acendeu vai bruxuleando nas ondas da borrasca moral que toma conta do País.



Gaudêncio Torquato é jornalista e professor titular da USP.

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POLÍTICA DE PRIVACIDADE

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