terça-feira, 27 de setembro de 2005

Vocação brasileira

Veja o artigo publicado na Opinião de O Globo de hoje:

Jóia da primavera

XICO GRAZIANO

Cresce na economia rural uma percepção angustiante: não adianta produzir, é preciso vender. Antes, a questão fundamental residia na produção. Sabendo plantar, bastava colher e levar para o consumo. Agora, tornando-se grande exportador de produtos agrícolas, o Brasil depende também do crescimento mundial. Nessas condições, aumentar a produção rural pode se transformar em problema. Vai vender para quem? Com que preços?

A profissionalização do campo exige raciocínio inverso do tradicional: produzir aquilo que vai vender. Fácil de falar, difícil de fazer. Onde se encontra o maior obstáculo?

Paradoxalmente, no extraordinário potencial da agricultura brasileira. Cultivam-se no país 62 milhões de hectares. Estima-se, ainda, que outros 90 milhões possam, com a tecnologia existente, ser aproveitados. Com tanta fronteira a expandir, a maior vantagem pode ser estorvo.

O país desperdiçará sua fabulosa fronteira agrícola se provocar expansão desenfreada sobre as áreas virgens. Mais acertado será realizar planejamento da produção, selecionando o que produzir.

Existem três grandes oportunidades. Primeiro, na produção de proteína animal, incluindo matéria-prima para rações. As nações emergentes irão demandar muita carne. A condição tropical facilita a criação a pasto e, investindo em sanidade, o Brasil será imbatível no mercado de proteína animal.

Segundo, vem aí a era dos biocombustíveis. A agricultura passará a ocupar nova função — a de geradora de energia, através do álcool anidro e do biodiesel. Somando-se as várias alternativas, até 2020 o país poderá ampliar em 50% sua área plantada, ou seja, incorporar mais 30 milhões de hectares à produção. Esse crescimento está longe, como se percebe na futurologia rural, de esgotar o potencial produtivo da agricultura.

Há uma terceira grande oportunidade, freqüentemente esquecida na economia rural. Trata-se da silvicultura. As florestas plantadas geram celulose e papel, fornecem madeira para a movelaria e a construção civil, além do carvão vegetal para uso energético. O déficit de madeira no país é tão preocupante que se aventa a possibilidade de ocorrer um “apagão florestal”. Plantar árvores é o melhor negócio do momento.

O Brasil destina, atualmente, 5,2 milhões de hectares para as florestas plantadas, principalmente eucaliptos e pinus. Tal área poderá se expandir fortemente. As árvores plantadas aqui crescem três vezes mais que nas florestas frias dos concorrentes. O resultado se manifesta na agressividade das exportações de celulose e papel, que deve atingir US$ 3,5 bilhões em 2005. Um show.

Internamente, quanto mais madeira produzir, mais aliviará a pressão sobre a Amazônia. O carvão vegetal, originado de eucaliptos, bota para escanteio o óleo combustível das caldeiras. Móveis com aglomerados de pinus substituem vantajosamente as madeiras de lei. Chega de ripa de peroba nos telhados.

A exuberância das matas nativas permitiu erguer certo preconceito contra as plantações florestais. Alguns as consideram florestas “artificiais”, outros as taxam, pejorativamente, de plantas “exóticas”. Pura bobagem. Artificiais são árvores de plástico; exóticas são todas as espécies cultivadas, como o café, a laranja, o arroz, o feijão. Alguém as condena?

Vale a pena, ao iniciar a primavera, descobrir essa jóia escondida dos agronegócios. Amanhã, o presidente Lula inaugura a Veracel, fábrica de celulose e papel que consumiu investimentos de US$ 1,2 bilhão. Instalada no sul da Bahia, uma região pobre, mais que árvores, planta-se ali o desenvolvimento.

A exclusão se combate, mesmo, gerando empregos. Afora o trabalho direto na indústria, as parcerias florestais garantem renda constante e longa aos agricultores familiares. Plantar árvores forma uma espécie de previdência.

Bom momento para fomentar a silvicultura, livrando-a da tutela do Ibama, dando-lhe a maioridade. Preservar e produzir, simultaneamente, essa é a equação do desenvolvimento sustentável. Com inclusão social.
XICO GRAZIANO é agrônomo e deputado federal (PSDB-SP). xicograziano@terra.com.br.


Temos a vocação. Parece que a gente não sabe.

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