terça-feira, 18 de outubro de 2005

Governistas que fazem

Helena Chagas em OGlobo:

CPI da Enrolação

Vem cá, gente: alguém sabe para que serve mesmo a CPI do Mensalão? Essa é uma pergunta que não quer calar há tempos, talvez desde o dia de sua instalação. Mas agora que o Conselho de Ética abre processo contra 11 deputados que mamaram no valerioduto e outros dois renunciam, não há como não se voltar os olhos para o que essa CPI fez — e sobretudo para o que não terá feito.

A CPI dos Bingos é território livre da oposição, que marca presença por lá com o único e exclusivo objetivo de infernizar a vida do Planalto. A CPI dos Correios, onde o governo tem maioria exígua e tem tido que engolir muita coisa, continua tateando à procura da origem do dinheiro, mas vem conseguindo salvar as aparências com relatórios parciais, entre eles o dos 18 do mensalão. A do Mensalão, que os governistas preferem chamar de CPI da Compra de Votos para assustar os tucanos, não fez nem uma coisa nem outra: nada acrescentou sobre o valerioduto e nem investigou até

O dever de casa não foi e, ao que tudo indica, não será mais feito. Isso vai dar um trabalhão ao Conselho de Ética, que terá que reunir as provas que não recebeu e pode acabar livrando a cara de alguns num eventual processo na Justiça, onde tudo isso ainda pode ir parar.

Depois de dezenas de depoimentos no modelito CPI-espetáculo, ficou faltando o básico: uma investigação bem feita. É uma pena, mas já se pode fazer um inventário do que ficou faltando:

1. O relatório que pede a cassação dos deputados envolvidos no escândalo do mensalão não é da CPI do Mensalão. Isso mesmo: o relatório que citava 18 deputados, que passaram a 13 e agora a 11 é da CPI dos Correios e foi elaborado por seu relator, Osmar Serraglio (PMDB-PR). Numa sessão conjunta em que sequer houve votação nominal, a CPI do Mensalão — que, em tese, é quem devia investigar o assunto — o discutiu e adotou.

2. A CPI não ouviu acusados e diversos sacadores. Isso nunca se viu em qualquer CPI. A maioria dos deputados da lista dos 18 sequer foi ouvida na CPI do Mensalão, caso dos petistas Paulo Rocha, João Paulo, Professor Luizinho, João Magno e Josias Gomes. O líder do PMDB, José Borba, também não. Na ocasião, os deputados pressionaram para não prestar depoimento. Depois, muito convenientemente, recorreram ao STF alegando não ter tido direito de defesa. Alguns sacadores do Rural também não foram ouvidos, bem como assessores dos deputados. Documentos por eles apresentados na tentativa de mostrar que o dinheiro destinava-se a despesas de campanha também não foram checados. Ainda que provas reunidas a partir da quebra de sigilo das contas do valerioduto sejam relevantes, podem não ser suficientes.

3. Cadê o resto? Todos sabem que houve mais deputados recebendo dinheiro, além dos 18 apontados inicialmente e dos 11 que restaram, sobretudo no PP, no PTB e no PL. A dispersão da CPI em depoimentos diversos e repetitivos (boa parte dos depoentes foi a duas ou três CPIs dizer a mesma coisa), a falta de foco e, sobretudo, de uma investigação documental confrontando quebras de sigilo e outros dados fez a comissão morrer na praia. Sente-se no ar o cheiro de outras maracutaias. Mas a CPI não é capaz de identificá-las e nem parece animada a fazê-lo até o fim dos trabalhos, em novembro.

4. Para onde foi o dinheiro? A questão não é só a origem do dinheiro que entrou no valerioduto. Não houve também investigação maior sobre o destino dos recursos sacados pelos deputados. O que fizeram com a grana? Uma investigação eficiente certamente desmontaria versões apresentadas pelos cassáveis de que se tratava de recursos para saldar dívidas partidárias ou de campanha. Qualquer prova em contrário transformaria um pecado de caixa dois em crime de corrupção comum.

5. Afinal, é mensalão ou não é? Não importa o nome, mas outro dever de casa mal feito foi a investigação sobre o pagamento a aliados em troca de votos em plenário ou de mudança de partido.

6. E a compra de votos? Apesar das promessas e da convocação sempre pendente do deputado Ronivon Santiago, se depender do que a CPI fez até agora, ninguém sabe e ninguém viu.

7. Próximo espetáculo: a superacareação. Em vez de se debruçar sobre documentos e provas, a CPI do Mensalão prepara para amanhã mais um show que vai deixar o país parado na frente da TV: a acareação entre Marcos Valério, Simone Vasconcelos e seis sacadores do Banco Rural. Haja audiência.

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